segunda-feira, dezembro 05, 2005

Egoisticamente falando...

Ela saiu andando pela avenida mais movimentada, olhando os olhos opacos das pessoas. A luminosidade dos letreiros roubou o brilho de cada ser urbano, que só pode ser visto através dos olhos. O dinheiro finalizou o serviço: cegou todos.
Não é uma cegueira física, como a do livro do Saramago (apesar de no livro não ser apenas física, claro, senão não teria sentido). É uma cegueira de alma, fumaça que nebula a personalidade.
Viramos bicho. O bicho mais nojento, nojento, nojento mesmo: ataca sem fome.
A diversão é gritar "seu egoísta", "seu pedante", "seu injusto", "seu mentiroso", "sua altiva". E ao final, dizer dissimuladamente ou não "eu estou falando isso para o seu bem, para você enxergar (a pessoa má) quem você é, para poder mudar-se".
Será? Talvez.
As instituições religiosas se divertem com os seus fiéis. Os fiéis se divertem com os seus filhos. Os filhos, com os seus bichinhos de pelúcia.
Ela havia saído de casa confusa, sem saber quem estava certo, se as pessoas podiam abusar assim das palavras, se estava curada ou mais enferma que antes.
O mar. Chegou ao fim da avenida, que já não era mais tão movimentada assim. Deu o primeiro mergulho no mar, e viu, refletidos na água, os olhos de uma criança.